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Soberania em Trânsito: Da Independência Nacional à Democracia Digital
Jhennifer Hannah

Jhennifer Hannah

Advogada

Soberania em Trânsito: Da Independência Nacional à Democracia Digital
Imagem via Freepik

No dia 7 de setembro de 1822, Dom Pedro I proclamava, às margens do riacho Ipiranga, a independência do Brasil. O gesto simbolizava o rompimento formal com a metrópole portuguesa e a conquista da soberania nacional o direito do país de se autogovernar, fazer suas leis e decidir seus destinos sem subordinação externa. Mais de dois séculos depois, o Brasil continua enfrentando desafios profundos para preservar e atualizar essa soberania. Só que, agora, o campo de disputa não é apenas geopolítico ou econômico é também digital.

soberania, enquanto princípio fundamental do Estado moderno, tem duas dimensões: A interna, que garante a autonomia para organizar a vida política dentro do território nacional. E a externa, que representa a independência frente a outros Estados e interesses estrangeiros.

Em 1988, a Constituição Federal redefiniu essa soberania ao colocá-la nas mãos do povo. A “soberania popular tornou-se, então, o eixo central do Estado Democrático de Direito, com o voto direto, secreto e periódico como seu principal instrumento.

Contudo, o cenário político da era digital exige que voltemos a pensar o que significa ser soberano em um mundo onde algoritmos, plataformas digitais e corporações transnacionais moldam comportamentos, definem o acesso à informação e afetam diretamente a formação da vontade política.

A consolidação das tecnologias da informação e comunicação (TICs) modificou profundamente o espaço público. As redes sociais tornaram-se arenas políticas e também zonas de manipulação. O escândalo da Cambridge Analytica e os episódios envolvendo o uso de microtargeting comportamental em eleições no Brasil e no mundo evidenciaram que o poder digital pode ser usado para violar a vontade popular de forma sutil, invisível e altamente eficaz.

A coleta massiva de dados, a vigilância digital e os algoritmos que “personalizam” conteúdos políticos geram uma nova forma de dominação. Não se trata mais de tanques ou tropas mas de códigos e cliques.

Autores como David Harvey e Samir Amin já alertavam para a permanência do imperialismo sob novas roupagens: monopólios tecnológicos e financeiros que controlam não só mercados, mas também consciências. Silveira (2021) chama isso de “colonialismo de dados”: países periféricos tornam-se dependentes de plataformas digitais estrangeiras, que operam com lógica privada, mas com impacto público.

Constituição de 1988, conhecida como “Constituição Cidadã”, garantiu o direito à privacidade, à liberdade de expressão e à proteção contra abusos do poder. Porém, no mundo digital, esses direitos enfrentam novas ameaças: Fake news que distorcem o debate público; Deep fakes que criam mentiras com aparência de verdade; E o controle do discurso político pelas big techs, que decidem o que será visto, promovido ou silenciado, muitas vezes sem transparência ou responsabilidade.

A soberania popular exige que o voto seja livre, consciente e informado. Quando esse processo é manipulado por bolhas de desinformação ou algoritmos invisíveis, a democracia é corroída por dentro.

O desafio atual do constitucionalismo democrático é garantir que os princípios fundamentais  como o pluralismo, a dignidade da pessoa humana e o próprio direito ao voto sejam protegidos também no espaço digital. Como lembra Boaventura de Sousa Santos (2012), a informação é a energia da sociedade contemporânea, e controlá-la é, em última instância, controlar a própria democracia.

Ao celebrarmos mais um 7 de Setembro, é fundamental lembrar que a soberania não é um ponto de chegada, mas um processo em constante disputa. Em 1822, a luta era pela autonomia diante de Portugal. Hoje, a luta é por garantir que o povo brasileiro continue dono do seu destino diante das novas formas de poder, muito mais sofisticadas e disfarçadas.

Se no passado nossa independência foi proclamada por um príncipe às margens do Ipiranga, hoje ela depende de um povo consciente, informado e digitalmente soberano.

Garantir isso passa por: Regular o poder das plataformas digitais; Promover educação política e midiática desde a base; Fortalecer a proteção de dados e a transparência algorítmica; E, acima de tudo, reafirmar o valor da Constituição de 1988 como escudo da soberania popular.

Porque a verdadeira independência aquela que transforma um território em uma nação não termina com um grito, mas se renova a cada eleição, a cada voto livre, e a cada cidadão que se recusa a ser manipulado.


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