A mentira e a desinformação sempre fizeram parte da comunicação humana, mas foi a partir das eleições presidenciais dos Estados Unidos, em 2016, que o fenômeno passou a ser amplamente conhecido pelo termo “fake news”. A disputa entre Hillary Clinton e Donald Trump foi marcada por uma enxurrada de notícias falsas, principalmente no Facebook.
No Brasil, as fake news ganharam protagonismo durante a campanha presidencial de 2018, impulsionadas pelo uso massivo do WhatsApp — uma plataforma onde as mensagens circulam em grupos fechados, dificultando o rastreamento e a responsabilização pelos conteúdos compartilhados.
Com a popularização dos smartphones, mudamos radicalmente nossa forma de consumir e produzir informação. No artigo “O fenômeno das fake news: definição, combate e contexto”, publicado pela revista InternetLab, os autores analisam esse fenômeno como resultado da horizontalização da comunicação. Ao contrário dos meios tradicionais — como rádio, televisão ou jornal impresso —, as redes sociais nos mantêm conectados o tempo todo, bombardeados por um volume de informações muito maior do que somos capazes de processar.
Essa nova lógica da comunicação digital trouxe inúmeros avanços e facilidades. Ferramentas como o WhatsApp aproximaram pessoas, ampliaram o acesso à informação e democratizaram a produção de conteúdo. No entanto, essa mesma democratização criou a ilusão de que estamos sempre bem informados.
Os algoritmos das plataformas digitais são programados para priorizar conteúdos que provoquem fortes reações emocionais — especialmente indignação e ódio —, o que favorece a viralização de notícias sensacionalistas e falsas. Como essas publicações costumam ser mais chamativas e memoráveis, acabam ganhando mais visibilidade e engajamento. E, ao contrário do jornalismo profissional, as fake news não passam por verificação de fatos, o que acelera sua disseminação. A verdade, nesse cenário, chega sempre depois — quando já é tarde para desfazer o dano causado pela mentira.
Além disso, criar uma notícia falsa é barato, fácil e rápido. Basta uma motivação mal-intencionada e um celular. Já a produção jornalística exige tempo, apuração cuidadosa e compromisso ético.
Outro fator central é a polarização, intensificada pelos próprios algoritmos das redes sociais. Eles criam bolhas e câmaras de eco, nas quais circulam apenas opiniões e informações alinhadas às crenças de cada usuário. Isso reforça o chamado “viés de confirmação” e reduz a possibilidade de diálogo.
Todos esses elementos — a facilidade de disseminação, a ausência de checagem e o estímulo à polarização — ajudaram a construir o cenário que culminou nos atos antidemocráticos do dia 8 de janeiro de 2023. Naquela data, milhares de pessoas, organizadas em caravanas financiadas por empresários ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro, invadiram o Congresso Nacional, o Supremo Tribunal Federal e o Palácio do Planalto, patrimônio dos Três Poderes foram destruídos. Houve um apelo aberto por intervenção militar após o resultado das eleições de 2022, que elegeram Luiz Inácio Lula da Silva presidente da República.
Antes dos ataques, circulava nas redes uma campanha sistemática de desinformação, questionando a integridade do sistema eleitoral brasileiro. Áudios e vídeos editados e falsificados foram compartilhados para “comprovar” uma suposta fraude nas urnas. Ao mesmo tempo, crescia uma mobilização pedindo a intervenção das Forças Armadas.
A combinação entre desinformação, radicalização política e descrédito nas instituições — especialmente o Legislativo e o Judiciário — alimentou uma parcela da população que passou a habitar uma realidade paralela. As fake news funcionaram como combustível para o ataque ao maior símbolo da democracia brasileira: a sede dos Três Poderes.
O episódio escancarou o nível de polarização no país e mostrou o quanto a desinformação pode corroer os pilares do Estado Democrático de Direito.
No Solidariedade, acreditamos que o diálogo é o único caminho para preservar a democracia conquistada com tanto esforço. Por isso, combater a polarização é uma das nossas prioridades.
E qual é o papel da imprensa no combate às fake news?
A imprensa desempenha um papel fundamental no enfrentamento às fake news, principalmente por meio do letramento midiático — ou seja, da educação do público para avaliar criticamente as informações que recebe pelas redes sociais. O jornalismo profissional é essencial para apurar fatos, desmentir boatos e investigar redes de desinformação.
Em um cenário cada vez mais marcado pela incerteza e manipulação, a credibilidade é o ativo mais valioso da imprensa. A ética e a imparcialidade, pilares do bom jornalismo, são os melhores antídotos contra as notícias falsas.