Carregando...
A mudança de nome dos partidos nos últimos dez anos
Cláudio Prado

Cláudio Prado

Consultor da Fundação 1º de Maio

A mudança de nome dos partidos nos últimos dez anos
Metade dos partidos políticos brasileiros modificaram a nomenclatura. Alteração indica adequação aos novos tempos.

A importância das representações partidárias para a democracia é reconhecida por todos os estudiosos do tema e tem-se a compreensão de que sua função primordial é a de atuar como “agentes do processo democrático”. No entanto, os partidos políticos, além de estarem no epicentro da denominada crise de representatividade, causam natural desgaste e põe à prova a legitimidade do sistema político.

Um levantamento feito nas eleições 2018, indicado por Luis Macedo da Câmara dos Deputados, mostrou que oito em cada 10 brasileiros, o equivalente à 78% da população, afirmaram não ter nenhuma confiança nos partidos políticos. Em 2014 este número foi para 46,6%.

Em abrangência nacional, 32 dos 35 partidos com registro no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) conseguiram eleger representantes para os seis cargos em disputa nas eleições de 2018: presidente da República, governador, senador, deputado federal e estadual/distrital. Somente PCB, PCO e PSTU não tiveram êxito eleitoral. Desde dezembro de 2019, o Brasil tem 33 partidos políticos legalizados no Tribunal Superior Eleitoral.

Nos últimos anos, dez siglas partidárias mudaram de nome e agora se apresentam ao eleitor sem a letra “P”, que realizava o papel de representar a palavra “partido”.  Nessa leva de mudança de nome, o PTC lançou a logomarca AGIR!36, que foi exibida em encontro no dia 16 de junho de 2021. Também surgiram agremiações registradas oficialmente pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na última década, que abdicaram do termo “partido” em suas designações.

A colocação de Evaldo Magalhães feita para o portal Hoje em Dia contextualiza bem essa mudança. Para ele, “a crise política obrigou alguns dos principais atores do sistema partidário brasileiro a se reinventar para superar a crescente desconfiança do eleitorado. A estratégia será novamente testada em 2022. Nos últimos dez anos, várias legendas – grandes, médias e pequenas – mudaram oficialmente de nome ou já se lançaram sem a letra P, abolindo a palavra Partido e buscando o que o mundo corporativo define como reposicionamento de marca.”  

Em entrevista ao portal Correio Braziliense, três dirigentes partidários emitiram opinião sobre a nomenclatura dos partidos. Um deles foi o presidente do Solidariedade, deputado federal Paulinho da Força. “Gostamos da ideia para sair dessa coisa de partido e criar uma marca e um programa sobre isso. Não é só fazer política, mas desenvolver ações de solidariedade mesmo. O nome pouco convencional para o eleitor pode impor dificuldades em um primeiro momento. O pessoal não acha que é partido, acha que é movimento.”

Sobre as mudanças nos demais partidos, Paulinho acredita que existam variadas razões. “Acho que tem uns querendo se esconder, outros se espelham em partidos de fora que têm dado certo. E tem muito da história do eleitor que não aguenta mais partido.”, concluiu o deputado.

Já para a deputada federal Renata Abreu (SP), a mudança tem a ver com o fato de o mundo exigir outra forma de organização, de maneira que em um futuro não existam mais partidos políticos. “Somos cidadãos do século 21, mas lidamos com instituições concebidas no século 18. O que mobiliza hoje a sociedade não é mais a ideologia de esquerda ou direita, mas as causas, que são muito dinâmicas”. O ex-deputado Roberto Freire acredita que “a comunicação direta com o eleitor é uma nova realidade. Hoje é só pelas redes, ninguém espera mais uma articulação partidária por células em sindicatos de base.”

No entanto, a negação da política por parte de muitos dos cidadãos tem causado perigoso distanciamento das estruturas partidárias organizadas, o que pode levar a um estrangulamento daqueles que são, ainda, os principais interlocutores entre povo e poder. A tendência é mundial e revela mudança na relação do eleitor com a política que dispensa mediadores e tem campo aberto no meio digital.

Dificuldades a serem vencidas nas eleições de 2022 por todas as legendas, com ou sem a mudança de nomes:

  • Voto em legenda nas eleições municipais registra menor patamar dos últimos 20 anos;
  • A eleição de 2020 acentuou a tendência de queda do voto em legenda em todo o Brasil. Foram pouco mais de 5,6 milhões contra 7,4 milhões registrados em 2016. Esta foi a disputa municipal com a menor soma de votos direcionados diretamente aos partidos em 20 anos.

De acordo com reportagem do portal Factual900, “jovens se sentem mais atraídos pela política quando suas ideias e suas vozes são ouvidas por partidos e movimentos de renovação, o que abre espaço para o debate em relação ao incentivo à participação política”. A queda dos votos de legenda tem expressado essa desconfiança partidária que se deve principalmente à ausência de conexão com os anseios de parte da sociedade.

A reportagem ainda aponta que “a internet e os meios de comunicação em massa são grandes aliados para chamar a atenção da juventude sobre a importância da participação política. Se os jovens estão conectados o tempo todo, sobretudo nas redes sociais, a campanha eleitoral deve se concentrar nesse ambiente digital.” 

Para o sociólogo Eduardo Grin, “Hoje, os jovens estão em busca de formas de participação mais adequadas aos seus ciclos geracionais, sem necessariamente ter a rigidez dos partidos. A filiação partidária dos jovens é importante para garantir o processo de renovação política, necessário em uma democracia. Querendo ou não, é por meio dos partidos que se organiza o processo de escolha de representantes. O afastamento da juventude significa que estamos fortalecendo lideranças velhas”.

Representações partidárias se modernizam para a juventude, mas idosos ainda representaram 20% do eleitorado de 2020

De acordo com um levantamento feito pelo G1 com dados do eleitorado disponibilizados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), um a cada cinco eleitores aptos a votar nas eleições de 2020 era idoso e, portanto, fez parte do grupo de risco do novo coronavírus.

No total, foram 30 milhões de pessoas a partir de 60 anos, o equivalente a 20% do eleitorado, o maior percentual já registrado desde 1992. Em números absolutos, a quantidade de eleitores idosos saltou de 9,5 milhões em 1992 para 30,2 milhões em 2020.

Enquanto no Brasil a média é de um idoso a cada cinco eleitores, este percentual é ainda maior em alguns estados. Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul lideram o ranking com 25% dos eleitores com idade a partir de 60 anos – ou seja, há um idoso para cada quatro eleitores. Em seguida, aparecem Minas Gerais (23%), São Paulo (22%) e Paraná (21%).

This image has an empty alt attribute; its file name is idosos-eleicao-1024x519.png

“Chama a atenção a super-representação partidária nessa faixa etária. Destes, 12 milhões estão acima dos 70 anos, ou seja 8,2% do eleitorado total. A representação da faixa etária entre os filiados é de 13,1%. Com certeza, há um desnível acima da média, mas é compreensível, considerando que essa geração viveu muita coisa em termos de política. Era jovem em 1964, quando começou o regime militar, viveu as turbulências, as Diretas Já, a redemocratização. Um tempo em que a vida partidária era muito mais intensa e atraente”, comenta o professor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB) David Fleischer para o portal Correio Braziliense.

Partido com representação na Câmara Federal

O Brasil vive um período de grandes mudanças e transições e os partidos estão querendo se adaptar a isso. São 33 partidos existentes, mas o eleitor perdeu a condição de acompanhá-los. Para Fleischer, a troca na nomenclatura se trata de uma jogada de marketing político e não interfere no posicionamento dos partidos na hora de votações tampouco nas posturas ideológicas.

O cientista político e professor da Universidade de Brasília (UnB) Ricardo Caldas, em opinião também para o Correio Braziliense, acredita que a mudança não altera a fisiologia dos partidos. “Vejo mais como tentativa de atrair eleitores e candidatos, de se aproximar do eleitorado. Quando a moda pega, a tendência é todos fazerem. O interessante seria uma mudança estrutural”.  

“O contexto atual de deficiência na formação qualitativa do debate propicia a difusão do argumento raso para temas profundos como, por exemplo, o futuro da Democracia Representativa em meio aos baixíssimos níveis de confiabilidade dos eleitores. Como agentes deste processo de transformação, os partidos políticos estão no epicentro da denominada crise de representatividade. O abalo que é sentido pelos eleitores põe à prova a legitimidade do sistema político, fazendo ecoar vozes antissistema, que pregam assepsia do modelo sem saber como e de que forma se ocupará o lugar, dado que não há espaços de poder vazios. Mas, nas democracias, o preenchimento de poder somente pode ocorrer com respeito ao Estado de Direito, às minorias e à pluralidade de pensamento”, aponta Fernando de Castro Faria da Universidade do Vale do Itajaí (Univali). 

Não é só a mudança da nomenclatura partidária que fará a manutenção de uma democracia verdadeira, mas sim, o entendimento de que todas as vozes são importantes.