O anúncio do presidente norte-americano Donald Trump de que iria impor tarifas adicionais de 50% sobre produtos brasileiros gerou, de imediato, preocupações econômicas e políticas. Se por um lado as expectativas iniciais eram de forte impacto negativo na balança comercial e no desempenho de setores estratégicos da economia, por outro, a intervenção direta na soberania nacional em função da defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro trouxe um elemento político para a relação comercial entre os dois países.
A atitude imediata do governo Lula foi de rechaçar qualquer interferência externa à soberania nacional e também de ressaltar a autonomia entre os três poderes, em especial a do Supremo Tribunal Federal. À época o governo encontrava-se “nas cordas” com índices de aprovação em baixa e sofrendo duras derrotas no Congresso Nacional. Contudo, após a euforia inicial do movimento bolsonarista – puxado pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL/SP), o qual assumiu publicamente que articulou nos Estados Unidos por sanções ao Brasil por causa do processo do pai – a reação na sociedade quanto ao comportamento dos dois espectros políticos trouxe novos ventos para o governo atual.
Grande mídia e empresários se manifestaram fortemente contra o tarifaço e aqueles que o defendiam. Já em agosto pesquisas de opinião da Genial Quest apontavam que: 71% consideram que Trump estava errado ao impor tarifas por acreditar que há perseguição a Bolsonaro e que 55% achavam que Bolsonaro e Eduardo estavam agindo mal diante do assunto.
Em 6 de agosto, as tarifas entram em vigor, mas foi com uma lista reduzida de itens (cerca 50% de toda a pauta de exportações para os americanos), atingindo em especial commodities como café, carne e suco de laranja. Os dados do Instituto Brasileiro de Economia, unidade da Fundação Getúlio Vargas (FGV) sobre os primeiros efeitos do tarifaço apontam impactos relevantes, no entanto não houve comprometimento estrutural da balança comercial, tampouco risco imediato de vulnerabilidade externa (as exportações brasileiras para o mercado americano representam apenas cerca de 12% do total exportado em 2024). A medida afetou segmentos específicos, mas não alterou a tendência de crescimento das exportações brasileiras no agregado. Ademais, houve rápida realocação de embarques para mercados alternativos, especialmente China e Argentina. Veja abaixo o quadro analítico a partir dos dados da FGV:
Efeito do Tarifaço de Trump
- Queda nas exportações para os EUA: -18,5% em valor e -15,4% em volume (agosto/25).
- Déficit com EUA aumentou: de US$ 745 mi (2024) para US$ 3,4 bi (2025).
- Aumento para China (+34,6% em volume) e Argentina (+45,7%) compensou perdas.
- Superávit com a China caiu: de US$ 28,5 bi para US$ 19,9 bi.
- Argentina virou saldo positivo: déficit de US$ 230 mi em 2024 → superávit de US$ 4,1 bi em 2025.
Para diminuir os efeitos das ações de Trump sobre a economia nacional e na esteira da campanha do governo em defesa da soberania, foi lançado programa Brasil Soberano, ancorado em um pacote de crédito de R$ 30 bilhões, incentivos fiscais, compras públicas e diferimento de tributos para as empresas atingidas pelo tarifaço – a participação no programa está condicionado à manutenção dos empregos.
Já os novos ventos iniciados em agosto, agora se consolidam como tendência em favor do governo Lula. Segundo dados da pesquisa Pulso Brasil/Ipespe (de 25 de setembro) a aprovação do governo cresceu sete pontos percentuais em um intervalo de dois meses e atingiu 50%, até maio, a distância entre aprovação e desaprovação chegava a 14 pontos percentuais.

Embora a melhora nas pesquisas não esteja ligada apenas à resposta ao tarifaço, ela tem um papel central na reconstrução da aprovação da população em relação ao governo e na construção de uma marca para a gestão (defesa da soberania) petista que até então não havia conseguido emplacar nada relevante. Portanto, o tarifaço de Trump, que surgiu como desafio econômico e risco à estabilidade comercial, acabou se convertendo em capital político para o governo, ao mesmo tempo que reduziu a força do seu principal antagonista, o clã Bolsonaro.